quinta-feira, 4 de março de 2010

Latour é o Dr. Quantum...(?)



Lembrar-se do exemplo da cidade imaginária de Planolândia, utilizada por Carl Sagan* em sua série “Cosmos”, pode refletir bem a questão moderna sobre a necessidade do “estar fora” para explicação as leis do mundo. O exemplo de Planolândia se refere à outras dimensões, mas pode, sem prejuízo algum, ser utilizado como metáfora para a parte inicial do capítulo 4 de Latour.
Estando “fora”, ou sendo possuidor de uma dimensão a mais, o Dr. Quantum**, - personificação da maçã utilizada por Sagan no seu discurso original e presente nas versões mais recentes de sua exemplificação - é capaz de ver além. Essa capacidade aterroriza um dos cidadãos que habita as duas dimensões. Tendo esse fato em vista, me pergunto, até onde Latour pode estar certo em criticar essa visão “fora/dentro” que perpassa o acordo moderno? Ele não nega as descobertas feitas por esse acordo, mas não nos mostra eventos que realmente tenham feito a diferença no mundo atual. O que Latour faz, até o ponto em que estamos, é voltar-se ao passado e verificar por sua conta e risco o seu modelo inserido ali; Latour se parece bem mais com o servente que move o alvo para que este se molde à flecha atirada pelo arco de seu amo. Até aqui, os argumentos não são costurados convenientemente, mas embolados tal qual um novelo de lã... Espero que, assim como ele tenta explicar a referência circulante na envolvente história da questão savana-floresta, e como, no presente capítulo, da odisséia do fermento - que não era fermento e que, se tornou, de fato, fermento - explique também como ele, um móvel-imóvel, translade-se de servente a amo, e que nos diga qual o rumo de sua flecha, que, aliás, se parece com a de Zenão (ou era uma tartaruga?).
Latour fala de futuro. Ele mesmo fala de sociedade e actantes. Mas não é ele mesmo que está sentado em seu escritório em Paris, escrevendo um livro motivado por uma inquietação pessoal? Onde está a sociedade, ou melhor, o coletivo, no trabalho que escreve? Eu não vejo nada além de sua própria caneta (Me desculpe se não uso os óculos certos, se não sei manejar o bonequinho e fazer teatro, se os meus insumos não estão produzindo a coisa certa, ou se minha trilha possui uma curva demasiado fechada, e se eu não faço as articulações corretas... mas eu estou tentando desvendar essa nossa “referência que circula”). O que há mais “fora” do que sentar e escrever?
 Por enquanto, admiro Latour pela posição pela qual ele encara todas as coisas, mas, a meu ver, assim como no acordo moderno, ele incorpora o nosso Dr. Quantum. Pra mim, é difícil imaginar um olhar-entre. Será que o peixe sabe que o mundo não é apenas feito de água? E não saberia o homem que pesca, que esse mesmo mundo é água, ar, fogo e terra?  Quem está fora e quem está dentro?
Os homens sabem que o mundo possui 4 elementos. Mas o homem não é capaz de ver as correntes quentes e frias presentes em um rio, por exemplo, coisa facilmente assimilável por um peixe, eu diria. O peixe perde em visão geral, mas ganha em visão específica. De igual forma, o homem não sente as correntes de ar que os pássaros seguem. Estes últimos, ainda, possuem a capacidade de enxergar além: vêem a terra dos homens, os rios, lagos e mares dos peixes, e o horizonte que se desdobra em mil e uma cores diante deles. Além disso, creio que eles também saibam dos elementos. Se o homem perde em visão geral, neste caso, ele ganha em específica: ele pode não ver todas as correntes de ar, mas sabe que de tempos em tempos uma ave passa por ali, o que o faz ser hábil na caça, digamos. Quando se ganha em generalidade perde-se em especificidade...O que é estar fora e o que é estar dentro?


 *http://www.youtube.com/watch?v=aZyfkHg1H8Q&feature=fvw
**http://www.youtube.com/watch?v=GF_4J-hq0FI