sexta-feira, 27 de março de 2009

Memória e Sociedade

Memória e Sociedade
Ecléa Bosi

4 - A substância Social da Memória

Quando Le esse título fiquei me perguntando várias coisas: Substância social, mas o que será isso? A memória possui uma substância social? Se sim, como se constrói? Como se fundamenta?
Não sei se consegue apreender todos esses questionamentos.
Nos dois primeiros capítulos de Memória e Sociedade Bosi nos apresenta a velhice como uma categoria social, categorial esta sem muitos benefícios e créditos para a corrida mercadológica do capitalismo. Como ela diz no segundo capítulo: “Os burgueses desinfetam as paredes da eternidade. Para que lembrar? Para que se eternizar coisas? Já que os indivíduos buscam o novo.
No terceiro capítulo, Bosi expõe a biografia dos velhos, biografias estas ditadas pelos próprios velhos.
No quarto capítulo ela já analisa esses depoimentos. Ela se utiliza de um tempo sem fronteiras. Quando ela diz no primeiro capítulo: “A memória permite a relação do corpo presente com o passado e, ao mesmo tempo, interfere o processo “atual” das representações” (p. 46). Fica muito mais claro quando ela afirma: “Convém refletir sobre a divisão social do tempo que recobre as horas do relógio e impõe uma duração nova”. (p. 416), já no quarto capítulo.
Através da busca da substância social da memória, ou seja, aquele fato social que evoca lembranças, que forma as nossas lembranças individuais, mostra-nos a produção da subjetividade como algo não estático entre o social e o individual.
“...fica a idéia de uma apreensão do tempo dependente da ação passada e da presente, diversa em cada pessoa. Um tempo que fosse abstrato e a-social nunca poderia abarcar lembranças e não constituiria a natureza humana. É esse, que ouvimos, tempo represado e cheio de conteúdos, que forma a substância da memória”. (p. 422)

Dessa forma, com essa maneira de apreensão do tempo Bosi mostra-nos como é usada a expressão meu tempo, pois apesar de autores como Simone de Beauvoir dizer que “o tempo que o homem considera como seu, é aquele onde ele concebe a execução de suas empresas...” (p. 421), alguns velhos disseram que seu tempo foi o tempo em que Jesus andava no mundo, outros velhos ainda trabalhavam, ou sonhavam voltar a trabalhar. Assim, Bosi afirma que essa visão de Simone parece-lhe pessimista.
“O tempo social absorve o tempo individual que se aproxima dele”. (p. 418)
“... uns e outros sofrem de um processo de desfiguração, pois a memória grupal é feita de memórias individuais”. (p. 419)
“Outros ramos se nutrem de suas raízes e frutificam com vigor renovado, chamando para si a seiva dos galhos originais – a enxertia social não deixa que as lembranças se atrofiem”. (p. 426)
Parece-me que nessas passagens Bosi nos mostra como o social e o individual caminham juntos, entretanto não necessariamente um ao lado do outro, ou um construindo o outro de forma recíproca e mútua. Pelo contrário, essas duas diretrizes - o social e o individual se fundindo, se misturando, se usando. Tal afirmação fica mais explícita quando Bosi descreve momentos em que alguém lembra alguma passagem de nossa vida, mas caso nós mesmo não lembremos é como se aquilo não fizesse parte de nossa história, ou quando contamos nossas peripécias infantis, como se realmente lembrássemos de tudo, mas na verdade apreendemos de nossos pais, avôs que nos cantavam nossas histórias infantis. “O grupo é suporte da memória se nos identificamos com ele e fazemos nosso seu passado”. (p. 414)
Quando Bosi começa a delinear lembranças da família, lembranças do trabalho ela vai nos mostrando como ocorre uma produção da subjetividade mais específica, “Se, como diziam, a comunidade diferencia o indivíduo, nenhuma comunidade consegue como a família valorizar tanto a diferença da pessoa”. (p. 425), e continua afirmando que é dentro do seio familiar que a personalidade é mais avaliada, julgada. Mostra-nos como cada um descreve sua mãe, seu pai, seu avôs, sua família, algumas semelhanças podem até parecerem semelhantes, mas “O que as recordações tenham em comum, ou em paralelo, é o que esperávamos, mas o que nos chama a atenção são as diferenças de observações sobre o mesmo fato e essas lembranças em contraponto que embelezam ainda mais duas vidas já em si tão belas”. (p. 413)
Já nas lembranças políticas: “Na memória política, os juízes de valor intervêm com mais insistência. O sujeito não se contenta em narrar como testemunho histórico “neutro”. Ele quer também julgar, marcando bem o lado em que estava naquela altura da história, e reafirmando sua posição ou matizando-a”. (p. 453), afirmando que deve visualizar a “localização de classes e a profissão de quem está lembrando para compreender melhor a formação do seu ponto de vista”. (p. 454)
Assim, são os diferentes meu tempo descritos por cada velho que me leva a refletir sobre a singularidade da categorial social velho. Entretanto, não esquecendo que cada um é um indivíduo, e para a existência desse indivíduo precisamos da sociedade em uma relação dinâmica com cada um.





quarta-feira, 25 de março de 2009

Um bom filho a casa retorna.

Debaixo do sol escaldante saiu em direção ao Lions Clube, meia apreensiva com o que poderia encontrar. O caminho continuava o mesmo, a rotina das pessoas também. Lá estavam os ciganos sentados, a venda ao lado com pessoas na calçada, enfim tudo parecia no lugar. Entretanto, ao chegar bem pertinho do Lions, me perguntei cadê a música? Cadê a voz estridente de D. Zefa? Cadê o carrão de Marcus? Fiquei mais apreensiva ainda.
Mas, quando entrei poucas pessoas estavam ali, entre elas D. Zefa, D. Francisca, D. Helena, e mais umas 4 velhas que ñ me recordo o nome. Falei com todas elas, aliás fui muito bem recebida. E claro, me interrogaram sobre o Marcus, quando o professor iria voltar, como ele estava, o quanto ele fazia falta, o quanto adoravam ele, o quanto a dança fazia bem a saúde delas. Poxa, como nosso dragão reina.
Perguntei por D. Joana e descobri que ela ainda está em SP...
Conversando com elas descobri que hj foi o segundo encontro do ano. O primeiro foi dia 10/02, terça-feira passada n houve reunião por causa do niver de aju, e hj o segundo encontro.
No primeiro encontro D. Zefa me relatou que eles estavam fazendo um tal de cadastro, pra ser feita uma carteirinha e aí eles deveriam contribuir com uma quantia por mês. D. Zefa me disse que ñ ia dar nada, que eles disseram que era pras festas das crianças. E a partir daí ela me disse uma coisa muito interessante. Mais ou menos assim: querem que eu dê dinheiro pra crianças, a gente que ñ tem. “Eu que animo, canto, que puxo, ninguém nunca me deu nada” “E o que foi que eu ganhei?” e repetiu “E o que foi que eu ganhei?” continuando: ñ precisava ser muito, qq coisa... achei essa colocação surpreendente.
Depois ela foi me falar da frustração sem o professor Marcus, da falta da dança, e de cantar, que o Lions tava sem graça. E nisso já eram mais de duas e meia da tarde. Mais pessoas foram chegando e a tal da Sônia e do Cícero que era o “dia deles” (achei essa expressão interessante) não chegavam, os velhos começaram a falar que achavam que as reuniões vão acabar, que o Lions não estão dando tanta importância assim pra eles...
Ah! Antes disso quando eu, D. Zefa e D. Francisca conversávamos elas me diziam que queriam as reuniões com o Marcus, mesmo que fosse na UFS, aliás que preferiam na UFS, porque tinha mais espaço, e algo mais, que elas transpareceram ñ conseguir explicar. Uma outra senhora reclamava da coluna, que quando tinha as danças do Marcus e ela se remexia tava boa, mas depois que parou voltou a doer.
A conversando ia se prolongando a “pessoa do dia ñ chegava”, e D. Zefa foi se lembrar hj que seu niver foi dia 19/03 (dia de São José) e meio sem querer ela acabou comemorando na missa. Depois ela esqueceu quantos anos tinha, quando uma outra velha pergunto quantos anos ela tinha, ela respondeu 52, aí depois parece que caiu em si, e disse que tem quase 90, será mesmo?
Uma outra passagem que me chamou a atenção foi quando uma senhora disse que um velho, um bonitão, como disse ela, um que ñ era freqüente, mas que tava no último dia com a camisa e tudo, falou pra alguém que ñ voltaria mais pras reuniões do Lions, porque ñ trataram ele bem. Pelo jeito parece que alguém disse algo e ele ñ gostou.
A partir daí, fiquei me perguntando mais e mais porque que eles vão parar ali. Já que elas estavam mostrando que percebiam as nuances daquele espaço, que elas ñ eram tão importantes pro Lions, que estavam incomodadas com a questão do dinheiro. Mas, como uma senhora frisou que estava viúva a 2 meses e ali era uma forma de sair de casa e ñ ficar lembrando do esposo. Ou quem sabe quando D. Zefa disse que só via as amigas na missa, que elas ñ saíam que ali era o lugar para onde iam, além de casa, já que nas férias era missa-casa, casa-missa
Enfim, uma 2:40 a “pessoa do dia chegou” falou com todos, aliás foi aquela festa. E aí, óbvio ela foi falar do cadastro quem fez, ou melhor quem ainda ñ fez, era mais interessante. E mais engraçado foi que ela chegou pra mim e disse: “cadê o professor que toca aquele tambor?” como se ela ñ soubesse quem era o Marcus, ou fosse melhor ñ saber.
Depois a leoa foi supervisionar o andamento do Lions, e o Seu Cícero foi tirar a pressão dos velhos, nisso como já eram quase 3h e eu tinha aula, me levantei dei boa tarde a todos, falei que tinha sido um prazer revê-los, que ia tentar ver Marcus pra levar os recados de todos, e o tal Cícero até brincou comigo: “já vai?” “logo agora que eu ia tirar a sua pressão” e eu toda educada, “Minha pressão ta sempre 11 por 7 ou 10 por 6. E ele “pressão de jovem é outra coisa”.
Enfim, para mim a volta ao Lions clube foi muito produtiva, e inesperada... ñ imaginava o quanto que nosso dragão tava certo sobre a sua importância para aquelas pessoas e para a continuação da existência do grupo. Já que comparando a outros dias hj tinham poucas pessoas e como disse D. Zefa vai assim e logo, logo acaba...
Um fim nostálgico, talvez...

segunda-feira, 16 de março de 2009

Para aproveitar a carona da minha mãe já que ela iria ficar por aquela região, nessa sexta que se passou terminei parando na feira do bairro São José( desculpem se falei o nome errado, ainda vou confirmar com minha mãe o nome do bairro mas preferi já escrever).
Ela se situa numa pequena rótula se assim posso chamar presente em uma das ruas pertencentes a esse bairro. Devido a largura da rua há um maior espaçamento entre as fileiras de barracas, tornando por essa razão a passarela mais ampla e consequentemente proporciona uma maior circulação de vento.
Diferentemente da feira do Castelo Branco ela não forma uma passarela reta , mas sim faz curvas. Ela é menos extensa, porém não deixando de possuir a grande variedade de frutas, verduras e carnes. No entanto, ela não possui barracas que vendem dvds e roupas.Um fato que me chamou atenção é que a feira não inviabiliza a total circulação pela rua visto que ela é bastante ampla e acontece em apenas uma parte desta.
Os feirantes me pareceram bastante solicitos apesar de eu chegar em um horário que grande parte deles revezavam com seus companheiros para que pudessem almoçar. Por eu ter achado o lugar mais ventilado achei mais agradável, talvez também porque já estivesse mais acostumada com o ambiente já que a feira acontece na rua em que a minha avó mora.
Nessa rua vi poucos tomaradores de conta de carros, o contrário da feira do Castelo Branco, e poucos carregadores. Apesar de existir barracas, vendedores, compradores e outros integrantes pertecentes a esta assim como na feira que visito com maior frequência, pude perceber pelas diferentes expressões e novas possibilidades que um ambiente diferente oferece as particularidades de cada feira.

domingo, 15 de março de 2009

diário de conversas 13/03/09

I.
8:15 no ponto de ônibus respirando melhor e bebendo água pra recuperar da pedalada. Aparece um menino novo e se senta bem próximo a mim em cima do seu carrinho de mão.
Fico olhando ele tirar o boné, franzir a testa e enxugar o suor. Pergunto se está cansado (pergunta óbvia, mas tinha que começar de alguma maneira) ao qual me responde com balarçar de cabeça afirmativamente.
- Desde que horas tá aqui na feita?
- Desde as cinco horas.
- A feira começa esse horário né? Cedo ein...
- É...
- E quantos carregos já pegou hoje.
- Sete.
- Isso é bom ou é pouco?
- É pouco né? Dá pra nada...
- E o dinheiro ajuda em casa é?
- É, ajudar minha mãe...
Nisso chega um outro menino com seu carrinho de mão e se senta ao lado. Fica me olhando com cara de desconfiado e fala baixo com o-menino-novo. Desconfio que seja perguntando o que acontecera por ali...
Acabo deixando a conversa pra lá e fico só observando: escuto um falando que acha que já vai embora, não aguenta mais não. Cada carrego longe...
O-menino-novo comenta algo de um carrego. Não entendo a linguagem: "fiz dois por um". Como tava distante e não confortável pra entrar na conversa não perguntei nada...
Saem e vão comprar um pastel. Voltam, comem deitados no carrinho de mão e ficam calados.
Uma senhora chama distante... o-menino-novo sai correndo e o outro fica dormindo.

II.
Agora converso com Dona Rosália. Apareço pelo banca dela, pois soube que perguntara por mim. Fui lá e fui recebida com um sorriso, como sempre! Dona Rosália ou tá dormindo ou tá sorrindo.
Pergunto como ela está e diz que está bem, só um pouco cansada. Compro meus biscoitos e enquanto espero o troco pergunto como anda as vendas dessa sexta. Ela me diz que tá tranquila... vende umas coisinhas aqui outras ali e tá tudo bem. Aproveito pra perguntar sobre o preço da banca e me diz que na sexta passada não pagou oito reias não. Pois é um absurdo! Ela e mais um monte de gente não pagou o preço que eles queriam. E completa dizendo que acha que eles vão abaixar... não sabia quanto cobrariam a ela naquela sexta, pois o fiscal não tinha passado ainda.
- E a Associação dos feirantes? Você se associou a ela?
- Ainda não. Tô pensando e analisando pra ver.
- Tá desconfiada é dona Rosália?
- É minha fia... um pouco né? A gente tem que analisar pra ver se é bom mesmo o que eles querem fazer. Tenho que ver ainda... tá cedo por enquanto.
- É... tá certa a senhora. A gente tem que analisar mesmo...
- Pois não é? Tome seu troco..
Recebo um monte de moedas. Comento que gosto pois tenho um cofre. Ela me diz sorrindo que não faz cofre não porque cofre de pobre só serve pra pagar as contas!

III.
Pra terminar o dia, acho que não tinha como ser melhor. Uma visita na banca da Iete, a tia das cachaças! No pretexto de comprar uma garrafinha de cravinho de meio litro aproveitamos pra puxar conversa e ainda perguntamos o nome dela que não sabíamos até hoje. Ela nos contou que decobre se a cachaça é boa assim: dá uma balançada na garrafa; se fizer uma bolha no meio pronto! É da boa.
Nos mostrou tudo que tinha e disse que é ela mesma que faz. Que a vinte anos trabalha com isso e com a mesma cachaça sempre. Ficou nos explicando que se tiver achando o gosto do cravo muito forte é só colocar mais um pouco de 21 que quebra o gosto. Nos disse que ela faz forte, mas dependendo do gosto de cada um é só colocar mais cachaça.
Pergunto se vende muito na feira. Ela me diz que agora nem tanto por causa do bafômetro. Digo que não dirigo, então estou tranquila! Ela ri e me dá mais um copo pra experimentar.
Damos os "até logo" e....


até próxima sexta!

Diário 13 03 09

Quando cheguei nessa sexta, dei conta pela segunda vez da falta dos meninos que costumavam me receber antes da feira. Eles ficavam tomando conta dos carros estacionados e já eram conhecidos. Mas lembro também que uma vez um deles me falou que estava ali na feira só enquanto estava de férias, supus pela sua regular falta que suas aulas tivessem começado. Pois bem.

De início, fui recebido com uma notícia triste. Ao cumprimentar dona Finha, ela falou que a moça que vendia cocos junto ao vendedor de pastel do outro lado da rua e de frente para sua banca, tinha sofrido um acidente de moto e havia morrido uma semana depois. Não me explicou direito por causa do movimento grande que a feira tem nas ultimas duas sextas. Falei, então, com seu Juscelino que finalmente aparecera após ter passado por uma operação de hérnia. Brinquei, “seu Juscelino, quanto tempo que não vejo o senhor, fiquei sabendo que passou por um ruim... te passaram a faca e cortaram alguma coisa sua, mas agora ta melhor?” ao que ele rindo falou, “melhor eu tou... mas que história feia é essa que me passaram a faca e cortaram uma coisa minha, não teve isso não, viu? Ta tudo aqui certinho. Aí gosta de ser gaitoso né?” e ficamos rindo, enquanto ele me contava coisas sobre a operação que havia feito quinze dias atrás e tentava me convencer a comer pão com requeijão. Saí com a promessa de aceitar um café na volta.

E andando pela feira, parei pra falar com dona Rosália, vendedora de bolachas, tapioca e beiju. Comprei alguns biscoitos ao tempo que conversamos sobre o carnaval dela e sua constante cara de cansada. Disse que ficava cansada, pois tinha que, no dia anterior, fazer as coisas pra vender tudo fresquinho além de viajar de Itaporanga até aqui. Perguntei se ela trabalhava só naquela feira e ela disse que aqui em Aracaju sim, mas lá em Itaporanga ela ia também a uma feira de quarta para vender e na de sábado para comprar. Lembrando da semana anterior quando foi instituído o aumento do aluguel das bancas de R$ 6,00 para R$ 8,00 - o que causou tumulto e bastante reclamação, e até uma bicicleta passando com caixas de som por entre as bancas gritando que a associação de feirantes é contra o aumento (ao que parece, passou em várias feiras da cidade, se não todas) -, puxei por esse assunto com ela. Perguntei sobre o aumento do valor e ela disse que era verdade que cobraram sem aviso prévio e sem participação dos feirantes nessa decisão. Disse de modo indignado que não era certo, pois as bancas não haviam mudado, eram as mesmas armações velhas de metal, só mudara a lona que cobre nossas cabeças do sol e da chuva. Falou ainda que eles não haviam passado naquela manhã e não sabia se o preço continuaria depois da pressão da associação. Perguntei se o preço da banca em Itaporanga era o mesmo, disse sorrindo que lá é que é bom, as bancas são todas novinhas e eles pagam somente um real.

Me despedi de dona Rosália e continuei andando e cumprimentando os já conhecidos. Devagar, acabei por sentar ao lado de seu Juscelino levando biscoitos para comer com o café. Falei-lhe sobre a possibilidade de prolongar a pesquisa por mais um ano e sobre algumas idéias que trabalhavam na cabeça sobre o que fazer lá com essa continuação, ele mostrou-se bastante entusiasmado com isso e deu algumas idéias também – ficou bastante empolgado quando sugeriu trabalhar com imagem, sejam fotos ou vídeos. Conversamos sobre a morte da vendedora de coco: ele disse que ela, dois sábados antes, havia sofrido uma queda de moto e batido a cabeça; não foi ao médico mesmo sentindo dores e após uma semana, quando saia de um banho frio, caiu desmaiada e morreu antes de chegar ao hospital, descobriram que havia formado um coágulo em sua cabeça. Perguntei então quem era o rapaz que a substituía abrindo cocos ao lado da banca do pastel com caldo de cana, ele disse que era o irmão dela, que não o conhecia, mas imaginava que já trabalhasse também com cocos em outras feiras. Falamos ainda sobre o aumento do aluguel das bancas, seu Juscelino falou que o governo tinha imposto aquilo sem ao menos informá-los, simplesmente chegaram na sexta passada e cobraram oito reais, “sorte que a associação fez barulho e agora acho que o valor vai voltar ao que era”. Disse que a associação tinha apenas cinco meses, mas que ele já vinha pensando cinco anos antes que era preciso montar uma associação para defender seus interesses. Falou que agora estava certo, pois o governo ia conversar com a associação antes de implementar algum aumento, tinham agora um representante frente às imposições governamentais.

Do outro lado da rua, na esquina da farmácia dois homens tinham em uma caixa por volta de cinco filhotes de cão. Acompanhei seu Juscelino quando foi observá-los, disseram que eram filhos do cruzamento entre um pastor alemão e um fila, a mãe de cor preta e o pai marrom, por isso quatro deles eram negros com patas marrons e um deles todo marrom. Observando isso seu Juscelino questionou porque só um deles era de cor marrom e o vendedor respondeu dizendo que era coisa da genética. Citou o exemplo curioso de um professor seu que era branco feito leite, mas que tinhas os cabelos duros, disse que era por causa da genética, pois a família do pai era branca, loura, de olhos claros e a da mãe tinha ascendência negra, “então é assim, a genética é um bicho engraçado que vai láááááááá... longe e pega umas coisas daqui e outras coisas dalí mistura tudo e bota em você”. Feita e exposição sobre genética ele disse que fazia vinte reais no cachorrinho, seu Juscelino titubeou e acabou levando um por dez. Chegou mostrando para dona Finha o que havia conseguido a um preço bastante camarada, ela reclamou dizendo “mas você não tem juízo mesmo, não ta vendo que não tem mais onde colocar cachorro lá em casa? Já são cinco...”, só que quando ele falou o preço ela saiu para olhar os restantes. Nesse momento a banca de Finha ficou vazia e chegavam fregueses perguntando preços e comprando coisas, ficamos eu e seu Juscelino tentando fazer o possível, mas como ele já tinha dito há bastante tempo, “para ser feirante tem que ter ginga, tem que ter o dom” e eu e ele não tínhamos nem a técnica. Alguns fregueses ficaram rindo de nós e outros com a demora do atendimento foram embora. Então ela voltou com mais um cachorro mangando de seu Juscelino, pois o havia comprado por cinco reais. Agora eram sete cães.

terça-feira, 3 de março de 2009

Resumo encaminhado ao CONPSI

Ascese e bio-ascese na terceira idade

Na atualidade proliferam práticas voltadas para a população idosa, as quais compõem novos modos de enxergar e de convier com a velhice. Se durante muito tempo ela foi vista como momento de reflexão sobre a vida ou como prenúncio para a morte, hoje os mais velhos têm sua imagem atualizada em ideais de jovialidade, de disposição e de longevidade. Francisco Ortega define esse movimento como as práticas bioascéticas contemporâneas, em contradição aos modos de ascetismo da Antiguidade. Esse trabalho objetiva descrever e analisar as experiências de ascese e as vivências de bio-ascese entre sujeitos pertencentes a um grupo de terceira idade, organizando-se em torno de três eixos de investigação: as biopolíticas voltadas para a terceira idade apoiadas no discurso médico da manutenção da vida, da saúde e juventude; as experiências de ascese e bio-ascese contemporâneas e a produção de saberes no campo da psicologia direcionados aos idosos. Para isso, utiliza-se da cartografia associada ao método etnográfico nos procedimentos de observação e atividades desenvolvidas junto a grupo de terceira idade do bairro Rosa Elze, São Cristóvão em Sergipe. Em reuniões semanais foi observado e registrado, em diário de campo a convivência com os idosos, que tinham como atividade regular exercícios físicos como alongamentos, e danças populares, orientadas pelo professor de Educação Física da Universidade Federal de Sergipe, Marcus Monteiro. Neste momento da pesquisa, as atividades se concentraram em analisar as experiências de campo, articulando os sentidos produzidos às referências bibliográficas que fundamentam esse estudo. Preliminarmente, ao longo da estada com o grupo percebe-se uma demanda neles por uma psicologia “acolhedora” e explicativas das suas questões individuais e coletivas. Isso marca uma adesão entre produção de saber, biopolíticas e intensificação de bio-ascese, nos discursos de produção de carência na contemporaneidade.


PALAVRAS CHAVES: TERCEIRA IDADE; PRODUÇÃO DA SUBJETIVIDADE; VELHO; POLÍTICAS PÚBLICAS; BIO-ASCESE.

segunda-feira, 2 de março de 2009

aberto

achei que havíamos decidido sobre isso. daí fui lá e abrir as portas do blog a quem interessar possa. Se algum autor achar que não cabe, volto atrás. mas, o ponto franco do avaliador do trabalho do Lázaro é forte aqui e as pessoas precisam saber disso.

domingo, 1 de março de 2009

Sobre ciencia, inveção e CONPSi



Olá pessoas, sei que esse não é o espaço propício a esse tipo de discussão, mas gostaria de compartilhar a experiência com vocês. Lá vamos:



Na disciplina Social 3 é sugerido como trabalho de conclusão fazer um trabalho de "inciação ao método etnográfico", por assim dizer. Pois bem, período passado cursei a disciplina. Fiz um trabalho com meninos que pedem dinheiro ou vendem nos coletivos de Aracaju. Com um diferencialzinho: ao invés de usar as tradicionais referências do "campo psi", preferi trabalhar com literatura de ficção, poesia e filmes... A professora gostou do trabalho, os colegas também.

Aliás, foi seguindo a sugestao de um deles (Joazinho) que resolvi escrever o trabalho no CONPSI. A opinião de um dos pareceristas pode ser bem útil para conversarmos um pouco sobre o que é ciência...
"Pontos fracos: não é uma pesquisa científica"






CONTEMPORANEIDADE E MODOS DE INSCRIÇÃO NO ESPAÇO URBANO (Resumo do CONPSI)

Esse trabalho objetiva descrever e analisar modos de inscrição no espaço urbano da cidade de Aracaju problematizando a produção atual de feiras livres dimensionada a uma história do espaço público. De acordo com Michel Foucault, a implementação de técnicas e procedimentos governamentais que visavam racionalizar e controlar problemas propostos por um conjunto de seres vivos, biopolíticas, se deu em meados do século XVIII ao passo da consolidação do Estado Liberal. Neste sentido, a medicina social possibilita um outro espaço urbano, diferente do medieval, através da idéia de salubridade e dos procedimentos vigilantes da higiene pública. Porém o espaço urbano moderno guarda ainda a possibilidade de invenção de si e do mundo no sentido esboçado por Virgínia Kastrup, pois a modernidade também produz híbridos, objetos que se furtam às simplificações. Para isso, utiliza a cartografia junto ao método etnográfico nos trabalhos de observação e confecção de diários de campo sobre as relações entre história, rua, feirantes, consumidores e comércio local na feira livre do bairro Castelo Branco, na capital sergipana. Em visitas semanais foi observado e registrado aquilo que se configura como cotidiano da feira, privilegiando o processo de construção das histórias ouvidas e recontadas a partir da experiência de inserção e intervenção no campo. Esta é uma pesquisa em andamento, assim, as atividades de campo continuam, articulando os afetos e os sentidos produzidos às referências bibliográficas que fundamentam esse trabalho. Ao longo das visitas à feira livre percebe-se uma utilização do espaço e modos de fazer que por vezes transbordam às normas e regulamentações sanitárias ditas pelo Estado. A vida se faz num espaço de tensão entre o esquadrinhamento, a vigilância, as normatizações higiênicas e as práticas cotidianas, como as conversas e as histórias que são tecidas pelas pessoas que fazem a feira. Assim, a rua é um campo de mistura, lugar de possibilidades que produz modos de existir e se relacionar. Ao tempo que esses modos outros inventam no cotidiano, histórias e resistências às formatações da vida no espaço público.

Palavras-Chave: cidade; história; feira livre; invenção de si.