segunda-feira, 19 de abril de 2010

Agora eu já sei o que responder...

Desculpa tá tomando o espaço de voces, achei isso num blog, pus noutro e tambem to pondo aqui. Nem sei se podia, mas às vezes a gente tem que ser pentelho mesmo...

"Ajudamos a controlar crianças inquietas na escola, a melhorar a disciplina, a controlar a sexualidade; contribuímos com nosso saber para asilar os loucos, as prostitutas, os desempregados; ajudamos a ocultar a produção das desigualdades sociais justificando-as como diferenças individuais; criamos instrumentos de seleção e categorização; pusemos o homem certo no lugar certo; isentamos a escola de suas deficiências com nosso conceito de dificuldades de aprendizagem; chegamos até a justificar acidentes de trabalho pela pulsão de morte; construímos exclusão de minorias através da concepção de patologia nas condutas. Apresentamos como necessária e normal a constituição da família burguesa das camadas médias e condenamos as famílias das camadas de baixo poder aquisitivo à patologia; fizemos do homem branco, europeu, heterossexual, das camadas médias, o modelo da normalidade (...) Justificamos e reafirmamos a normalidade das condutas das camadas dominantes, apresentando-as como naturais. Retiramos desta natureza o conceito de normalidade. Enfim, tornamos normal o que é dominante. Esse tem sido o nosso compromisso social". (Ana Bock)

http://psicologiadospsicologos.blogspot.com/

sábado, 10 de abril de 2010

Impressões da Feira de Laranjeiras (II)






Com o intuito de verificar se a notícia de que a Feira da cidade de Laranjeiras iria sofrer uma mudança de lugar, com a visita ao local, obtive as seguintes impressões.



A feira livre é um local público que em determinadas épocas e dias fixos, se expõem e vendem mercadorias. Como acontece em diversas cidades do país, a feira da cidade de Laranjeiras, situada no interior do estado do Sergipe, é um fenômeno econômico social muito antigo, que já conta com mais de 17 anos de existência, mas que como toda e qualquer feira tem suas implicações de ordem pública e possui regras de criação e funcionamento que dependem da intervenção e da garantia do município.



Como as feiras se originaram há muito tempo, quando as pessoas se reuniam periodicamente em algum ponto pré-determinado da cidade para vender seus produtos à população ou mesmo realizar trocas, com o tempo o número de mercadores foi aumentando e o poder público interveio com o objetivo de disciplinar, fiscalizar e, é claro, cobrar impostos.



O papel das feiras tornou-se verdadeiramente importante a partir da revolução comercial, nessa época os mercadores realizavam transações comerciais e intermediavam trocas numa atividade eminentemente itinerante. Esta prática tornou necessário o uso do dinheiro, como havia pessoas que vinham de diversos lugares, existia então, uma grande variedade de moedas em circulação, o que ajudou e muito a desenvolver os bancos e o câmbio. As feiras eram localizadas em lugares estratégicos, como num cruzamento de rotas comerciais e algumas chegaram a ter abrangência internacional.



As feiras livres existem no Brasil desde o tempo da colônia e apesar dos tempos modernos e dos contratempos que elas causam nas cidades, elas não desapareceram, embora corra o risco, em muitas cidades do interior do país, elas são o principal e, às vezes, o único local de comércio da população, funcionando também como centro cultural e de lazer. Algumas pessoas circulam, examinam, pechincham ou simplesmente estão à procura do que desejam. Outras pessoas já têm suas barracas preferidas, conhecem o feirante de longa data e parecem mais amigos do que fregueses. Pode-se dizer que a feira é uma referência cultural, muitas vezes visitada por turistas e bastante frequentada por pessoas de cidades vizinhas.



Mas a feira está sendo descaracterizada, está sendo deslocada das áreas estratégicas para áreas de pouca movimentação e convívio social, geralmente distantes da zona de concentração populacional, áreas pouco habitadas ou mesmo desvalorizadas.



É o que está acontecendo na cidade de Laranjeiras. Numa visita a cidade, conversando com as pessoas que frequentam a feira, de uma maneira geral, a maioria se mostrou contra a mudança da feira para a praça de eventos da cidade, um dos principais motivos para que ocorra essa mudança é que a feira ocorre nas imediações do campus da Universidade Federal de Sergipe, além de interromper o trânsito, impedindo a circulação dos veículos, mas as pessoas alegam que a feira só funciona aos sábados pela manhã, e que já há uma tradição, um costume da feira naquele local, com a mudança de lugar haveria uma grande dificuldade de acesso, já que a feira seria dividida, pois o mercado de corte e cereais permaneceria no prédio vizinho a Universidade, mas as barracas de frutas e verduras seriam transferidas para a praça de eventos que fica do outro lado do rio, apesar da construção de uma passarela, os mercadores relatam que “os fregueses que forem ao mercado de corte, não vão atravessar a passarela para olhar se o tomate ou a cebola estão na promoção”, o que poderia acarretar prejuízos.
Enfim, a feira mais parece uma “confusão” perfeitamente organizada onde tudo funciona na hora e no lugar certo. É um lugar caricaturesco cheio de figuras ou personagens, cada um com sua história, um lugar com cheiros, sons, cores e luzes a serem descobertas, exploradas, fotografadas... na memória e na história.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

RELATO DA VISITA À FEIRA DE LARANJEIRAS

Teve o objetivo de averiguar o que as pessoas ligadas à feira de Laranjeiras - feirantes, vendedores ambulantes, comerciantes do local e compradores – achavam quanto à informação sobre a mudança da feira para a praça de eventos de Laranjeiras.

A feira acontece próximo ao recém chegado campus da Universidade de Sergipe no município, sendo estes um dos motivos apontados para tal mudança. Além disso, alegam que outro motivo da mudança se deve a feira estar atrapalhando a circulação de automóveis e outros transportes. A notícia da mudança era sabida pela maioria dos entrevistados, sendo que alguns comentavam saber a pouco mais de um ano e outro só a um mês. Uma compradora, que diz ser assídua, revela que não sabia da notícia da mudança e fica surpresa inclusive por saber que a entrevistadora que é de outro município sabia.

De um modo geral, a maioria dos entrevistados era contrário à mudança e estão descontentes com a mudança da feira. Entre os argumentos dessa contrariedade é que grande parte dos feirantes está acostumado com a feira nesse local, já que a mesma se encontra lá há muitos anos e acreditam que essa mudança da feira será para pior, seja para o comercio dos feirantes, visto que dificultará o acesso dos compradores à feira, apesar da passarela a ser construída, comentada por muitos entrevistados. Acreditam também que a feira ficará dividida, pois uma parte será transferida ao mercado (parte de “corte”) e a parte restante de frutas, verduras e etc, irá para a praça de eventos. Outros feirantes acreditam que o futuro espaço será insuficiente para comportar o tamanho da feira.

De modo controverso, uma compradora relata que a mudança pode ser interessante já que a feira se encontra muito apertada, o que dificulta conhecer as promoções, além de o atual local da feiras ser sobre pedras que dificultam o caminhar dos compradores, que correm o risco de tropeçar, por exemplo.

Curiosamente, um feirante comenta que o preço que paga pela estrutura montada da feira é de 7 reais por semana, sendo que antes era 6 reais e em época de eleição o valor era dividido entre o feirante e a prefeitura.

Quanto a opinião de uma vendedora da loja de material de construção que fica próxima à feira, menciona que a mudança trará vantagens e desvantagens para ela: de um lado proporcionará à loja que os veículos que transportam o material tenha fácil acesso para carregar e descarregar o material aos sábados (dia em que a feira acontece); por outro lado acredita que com a feira em outro local, poderá de certo modo diminuir o número de clientes na loja, além dela mesma ser compradora da feira e a mudança da feira de local dificultar seu acessa a ela.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Da Fabricação à Realidade (I)

Palavras e coisas. Entre os dois, um abismo colossal que tentamos suprimir com nossas engenharias de correspondência e representação. Com o Bruno Latour, a conversação é outra. Não mais a verticalidade do abismo entre discurso e mundo, mas a transversalidade das artérias pelas quais circulam as cadeias de transformações. O único discurso razoável e verossímel de uma mente sobre o mundo seria aquele que considerasse o maior número de relações que possibilita à ciência - e a própria mente, não mais isolada - existir! Se numa epistemologia tradicional quer-se libertar a ciência da sociedade, trata-se agora de ligar nossos saberes ao coletivo.
É comum escutarmos, pelos salmos dos estudiosos da ciência, jargões como "construção", "fabricação" e símiles no tocante à ação da ciência no mundo. Bonito, isso! Coisas, objetos, mundo; tudo é construído! Não obstante, essa metáfora bonita nos passa a idéia de que, se algo é fabricado, construído ou qualquer coisa que o valha, então este algo é falso e merece ser descontruído! "Coisa de pós-moderno frouxo!", resmungam os soldados da ciência. "Construir" e "fabricar" devem - segundo o Latour - ganhar novas significâncias, para além da analogia do mundo enquanto playground vazio à espera dos humanos brincantes.
Para a tarefa de Hércules, Latour se apropria do Mémoire sur la fermentation appelée lactique, considerado um dos textos mais importantes de Louis Pasteur. Através deste, Latour põe em ação duas narrativas: uma primeira, ontológica, sobre a conversão de atributos/desempenhos em uma substância/competência coesa (o que se aplica tanto ao ácido lático quanto ao próprio Pasteur); e uma segunda, epistemológica, acerca da construção dos fatos (e as implicações humanas e não-humanas deste desenrolar).
Logo no comecinho de seu artigo, Pasteur dita que a fermentação do ácido lático não possui uma causa óbvia. Se há algum fermento no meio desse processo, seria apenas um produto acidental e desprezível envolvido numa fermentação puramente química. Mas deixem-me situar, ligeiramente, o cenário de nossa historieta! Século XIX, círculos científicos, química de Liebig. Afirmar que um organismo vivo é o responsável por um processo de fermentação seria dar um passo atrás nas contribuições do senhor Justus e retornar às antigas explicações vitalistas que colocavam mais entraves e problemas que soluções e encaminhamentos.
Pasteur, ao que parece, pega bem essa onda. Não obstante, numa escrita abrupta, Luís grita: É ele - sim! - é ele, o fermento, que desempenha o papel principal! E, com este grito mágico, o fermento - que não passava de uma massa cinzenta aderida nos lados superiores do recipiente - torna-se, deveras, um fermento; deixa de ser nada e passa a ser alguma coisa! E o Pasteur, assim como a massa cinzenta do recipiente, também é transformado num outro, diferente daquele de antes do experimento! Este último ponto, prometo, ficará claro logo mais adiante. Tenham paciência, caros, e continuem a acompanhar nossa aventura. De começo, o leitor do artigo encara um mundo no qual o fermento/matéria orgânica é um substrato irrelevante ou mesmo decadente ao processo químico. Ao final do artigo, o leitor é transportado a um mundo no qual o fermento é uma forma de vida bem identificada e essencial ao processo químico em questão. Latour põe o problema: como Pasteur fez surgir, daquelas manchas cinzentas, uma entidade coesa (a saber, o levêdo da fermentação do ácido lático...)? Sua resposta: a nova entidade é um objeto que circula campos e mais campos de provas e transformações!
Não falei coisa com coisa, eu sei! Tentei explicar e trouxe mais confusão à saga. Mil desculpas! Uma vez mais peço mansidão aos corações dos senhores. Toquemos o barco que, assim espero, esta questão também será clareada. Sério! E, para abrir a mata rumo à essa clareira, Latour nos apresenta o seu conceito de nome de ação: uma série de desempenhos precede a criação duma competência que, no futuro, será considerada a causa destes desempenhos mesmos! Pegadinha: posso ser polvilhado, provoco reações de fermentação, turvo líquidos, consumo giz, formo depósitos, produzo gases, gero cristais e sou viscoso. Quem sou eu? Em primeiro, isto é apenas uma lista de itens que o Pasteur, provavelmente, registrou em seu caderninho enquanto traquinava no laboratório. O máximo que conseguimos tirar desta lista de itens é um ente frágil e indeterminado que, por enquanto, não passa de fruto da imaginação do Pasteur!
Seu Luís, não obstante, esmera-se para dar um estatuto ontológico à massa cinza que bordeia o recipiente. Mas do mesmo jeitinho que não basta ao bom candidato mostrar seu talento para ser considerado um ator, não basta fazer coisas para ser uma coisa! É necessário um contato, um peixe, uma ação por fora do palco, um ato por detrás das cortinas! Pasteur não hesita em mexer seus pauzinhos para pôr seu candidato sob os holofotes e compara o seu funcionamento, seu estilo de atuação, ao do já consagrado lêvedo de cerveja. A massa cinzenta recorre a um ator já estabelecido nos palcos da academia e, de mancha viscosa, passa à condição de entidade biológica, podendo inclusive ser organizada taxonomicamente. Não é, tão somente, um caso de transporte de informações que se transformam, mas é o próprio fermento que possui sua história de alterações ontológicas, passando de uma lista de atributos vagos à uma substância plena e viva!
Um ator se define através de suas atuações. Inferência simples, esta. E, para que o fermento bem-atue, o cientista elabora testes para o atuante mostrar quem é e como interage com outros atuantes. As cortinas do laboratório-cenário são levantadas por Pasteur para que seu novo candidato possa ser testado nesse mundo artificial. Desempenhos agregam-se numa competência! A mancha torna-se "O Lêvedo do Ácido Lático"! Num movimento posterior, a peça é encenada aos colegas acadêmicos de Pasteur, que dão o veredito quanto ao espetáculo. Noutros termos: há um primeiro teste, que se resume num conto de fadas, uma historieta linguística; um segundo teste, que é a configuração duma situação (aparentemente) não-linguística (tubos de ensaio, o fermento, o próprio Pasteur e seus ajudantes); e um terceiro, que é a tentativa de Pasteur - nos dois testes anteriores - em atribuir a competência do fermento ao próprio fermento, e não a sua habilidade retórica em inventar um teste para revelar um novo ator!
Um experimento, destarte, é um texto escrito para ser avaliado por outros para saber se é, tão somente, um texto. Caso a prova final seja bem-sucedida, entende-se que o texto não é, simplesmente, literatura ficcional, e que há verdade por detrás dele. O ator prova sua competência e o autor da novela, claro, também é modificado no processo; se Pasteur, através de seus testes, ajudou o fermento a se revelar para o mundo, o fermento ajudou Pasteur a ganhar uma medalha, a publicar um artigo e a se afamar na academia!
O fermento muda, Pasteur muda, a academia muda. Mas o que é exigido, no meio de tanta mudança, é a estabilidade do fermento. Não importa o quão engenhoso foi Pasteur ao criar seus dispositivos artificiais, os testes de seus colegas devem atribuir a invenção do fermento ao próprio fermento. Fato e artefato. Deste lado, as coisas são construidas; daquele, não há artificialidade nas coisas. E aqui esbarramos no principal entrave dos conceitos "construir" e "fabricar": tudo o que acontece, no vocábulo da ciência, é a descoberta do que já estava lá, seja "lá" a natureza ou a sociedade ou o que quer que seja. Um experimento - fabricado e não-fabricado ao mesmo tempo, saliento - enquanto "descoberta do que já estava lá" sempre vai apresentar um buraco, uma incógnita para a compreensão da originalidade na ciência. Para tampar este buraco, temos numerosas arquiteturas: a natureza exterior, sujeitos transcendentais, paradigmas sociais. A novidade científica, entretanto, se dá porque o experimento não é um "jogo zerado" ou um playground vazio à nossa espera; desvelamentos, a priorismos e potencialidades são apenas rebocos para sustentar um prédio destinado a ruir.
A ciência evolui por meio do experimento. Verdade. Mas o experimento não é uma descoberta, mas um evento circunstancial e histórico; história, esta, de humanos e não-humanos. Um evento no qual todos os envolvidos saem diferentes de como entraram: vide o fermento e Pasteur e mesmo a química acadêmica! Experimento enquanto evento e evento enquanto transformação. Espero, com este post, ter trazido alguma luz - ou, ao menos, não obscurecido de vez - à discussão desempenhos/competência para, assim, poder entrar de vez na temática de construção de fatos e o conflito - enfrentado pelo Pasteur - entre construtivismo e realismo...
LATOUR, Bruno; “Da Fabricação à Realidade";
In: A Esperança de Pandora: ensaios sobre a realidade dos estudos científicos; trad. Gilson C. C. de Souza; Bauru, SP: EDUSC, 2001; pp. 133-148.