quarta-feira, 24 de setembro de 2008

a feira vista por três pares de olhos

Começando pelo nosso combinado na reunião da quinta passada, só a título de explicação sobre nosso funcionamento de postagens, resolvemos nós três fazer nossos próprios registros sobre as visitas à feira, mandarmos uns para os outros (via e-mail) e depois, de forma consecutiva, um de nós escrever um outro texto para postar no blog. A bola da vez é minha, essa semana!

Confesso que reli algumas vezes nossos três diários para tentar achar uma ponte nos nossos escritos e uma ansiedade em fazer algo diferente acabou tomando conta. Meio experimental vai ser esse meu registro, pois é o primeiro.
Pegando a idéia de João de “este diário é um escrito do contrário”, começo não pelo seu fim que é o seu início, mas pela frase “como já bem disse Kleber, o ofício de pesquisador também trás seus ganhos para a vida doméstica”. Assim logo percebemos ao comprarmos tangerinas e quando comprei, pela primeira vez, uma couve-flor. A diferença da visita de João da minha, a princípio, era que “fui sem nada pra comprar, só tomar meu café da manhã”, enquanto João tinha dez reais pra gastar e chegar em casa com tangerinas, mangas e cana.

Depois de eu ser resgatada do meu entretenimento com uma “mulher emperiquitada, a avó fumando (aquela senhora que fica tirando os feijões da casca na minha primeira visita a feira) e o neto dizendo que queria um celular de brinquedo”, fui acompanhando João pelo caminho e a feira dele acabou virando minha também “pois parávamos pra perguntar o preço da manga e a tangerina mais bonita”. Ou como disse o próprio: “desenvolvemos enquanto consumidores nossos próprios passos. Buscando o melhor preço e a melhor qualidade, ou pelo menos um equilíbrio entre as partes”.

Há um ponto de encontro que acabei fazendo entre nossas percepções que é sobre a própria higiene do local, mas acabamos tratando de coisas diferentes. Bruna fala que chegou ao fim da feira e que esta seria “um momento de muita sujeira”, pois eram “frutas e verduras no chão, casca de amendoim, saco plástico...”. Eu observei isso já logo no início da feira que é tudo jogado no chão mesmo. Deparamo-nos uma vez, eu e João, na ocasião do anis estrelando, quando procurávamos um lixeiro pra pôr o copo vazio e perguntamos a uma mulher da feira que nos disse: aqui não tem lixo não, é tudo no chão mesmo, jogue aí!

Ainda na ocasião do (sempre bem-vindo) anis estrelado, João já havia feito uma visita ao banheiro público que por ali perto tem. Diga-se de passagem, que “consiste em dois box’s do tipo banheiro químico itinerante”. Achei engraçado na hora que li quando ele escreve “mijei esquivando-me da merda e prendendo a respiração”. Sim, na hora é engraçado quando se lê, mas é realmente um descaso com aqueles que fazem a feira acontecer e pensar como é que ficam aquelas pessoas que desde a madrugada estão ali pra arrumar suas bancas e só saem pra lá de meio-dia.

Já a minha percepção foi mesmo uma agonia que tenho ao passar pelas bancas que vendem as carnes. “Desvio o caminho e fico costurando de um lado a outro quando surgem essas bancas pelo caminho”. Posso até desviar meu corpo, mas minha atenção sempre se prende às mãos do homem pegando no dinheiro pra passar o troco e em seguida pegando na carne com o facão todo ensangüentado. Certa vez escuto aqui em casa que comprar carne na feira nem pensar, só no supermercado! Mas quem garante a higiene daquele que corta a carne lá? Só porque não está no alcance dos nossos olhos que acabamos confiando mais... Curioso isso. Mas sobre mim, to deixando até de comer carne (cômico!), mas até que de vez enquando esqueço isso tudo e só penso na minha boca salivando.

Uma coisa interessante que Bruna notou foi uma “criança vendendo as frutas e verduras da barraca à sua frente” e como já estão ali com responsabilidades a cumprir. Acrescento todos os outros meninos que por ali ficam: os do carrego, os que guardam o carro, e até os que ficam a deus-dará. Todos “eles também são a feira”, como dissera João. E temos também que voltar nossos olhos pra esses corpos que ali transitam com algum objetivo ou não. O “ou não” porque até mesmo “o homem que toma cerveja sentado do lado de dentro do bar vendo a feira como quem vê a praia num dia de sol” está ali e foi notado. Inúmeras coisas acontecem na feira e das mais inusitadas. Dá história pra qualquer contador que se queira.

Penso que mesmo a feira ressignificando o espaço da rua nas manhãs de sexta, como disse João, porque “impede carros de transitar, entrar ou sair, se apossa de calçadas e impede o trânsito de gentes que não passem pela feira”, aquela rua ainda continua com algumas de suas atividades. O barbeiro está ali com as portas abertas logo cedo cortando cabelo, a lanchonete “escondida atrás dos projetos de metal que são as bancas” distribuindo seus lanches, o salão que numa ruazinha logo ali às 8h já chegam suas clientes, a sorveteria que abre às nove horas... é uma nova configuração daquela rua que parece “violentar o espaço privado”. Talvez fosse interessante ver a relação dessas pessoas que têm suas casas tomadas por bancas de diversos produtos e a própria feira. Fico curiosa.

Enfim, concluo aqui algumas das impressões dos três pares de olhos que rondaram a feira nessa sexta-feira do dia dezenove. Sentindo que ficaram algumas impressões de lado e outras que não caberiam em palavras. Mas uma coisa é fato: a feira começa dentro de casa, quando se vê o que falta no armário e na fruteira.

3 comentários:

Mairla disse...

visita do dia 19/09/2008

Kleber disse...

Boa a metodologia de agregar os olhares. Precisamos adensar a percepção, talvez elegendo uma temática para problematização. Tipo a HIGIENE, já que essa salta aos olhos.
Começar a sistematizar conversa com o povo da fera também pode ser uma alternativa interessante. Podemos conversar sobre isso em nossos encontros. Abraço!

Bruna_ disse...

gostei,lendo o texto com uma parte dos três olhares percebi que não tinha percebido coisas que vocês perceberam e vice-versa