quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Masmorras e Dragões, 2ª edição...

Lion´s Club... Dia 22 de Setembro... Um grupo de terceira idade, semanalmente, reune-se para - convenhamos! - a concretização de práticas bio-políticas que... CÉUS! Até tento começar com vernáculos dignos de um relatório experimental, mas não posso deixar de compartilhar as impressões que, em mim, ficaram gravadas!

Com a equipe desfalcada, cheguei sozinho ao local de encontro. Meus companheiros epistêmicos - devido a infortúnios - não puderam comparecer. Pior! Até do Marcos me desencontrei!!! Tive de encontrar o LC à base de pernas e bocas. Informava-me com mulheres e varões, senhores e meninas. Estradas sem asfalto, nem sequer saneamento... Cachorros... Ruas sem nome... Ciganos... E um Sol que parecia ter em me castigar a sua razão-de-ser! Pensei - confesso - que minha empreitada até Roma não alcançaria sucesso. Mas eis que vislumbro, após ter perdido minha excessiva esperança (mas não minha parca energia...), o palácio dourado!

Adentro a masmorra, sem medo de defrontar quaisquer dragões; tudo em busca de um pouco de sombra, tesouro dos tesouros para um andarilho do deserto. A reunião já havia começado e, quando este que vos fala adentra o pátio principal, os olhares voltam-se contra mim, como que reconhecendo um antigo aventureiro que, em tempos passados, atravessou a comunidade. Sento ao lado do Marcos, com sua pose dracônica, e este, aos cochicos, pergunta pelos meus companheiros de campanha e pelo Senhor Monarca que enviou-me em missão. Desenvolvo uma oratória modesta (o máximo que minha respiração ofegante permitia...) e dou-lhe uma resposta qualquer (mas não qualquer resposta...) e ele silencia, como que satisfeito (e ainda criticam os Sofistas como vilões da Filosofia, vê se pode!?...).

A aventura, então, começa. Tivemos as mesmas atividades da semana passada, mas fui muito mais absorvido pelo movimento de então. Enquanto minha participação, outrora, poderia ser resumida em auxílio e assistência, participei como um nativo das festividades da aldeia, desta vez! Descobri, adentrando no labirinto, que O anel do cirandeiro brilha mais do que o Sol, e que, também, Parelha boa é de dois em dois. Nossa! Que sensação boa sente o herói que espera, estoicamente, armadilhas e desafios, mas dá de cara com moedas, coroas e banquetes. Poderia, sim, descrever pontualmente as maravilhas desbravadas, mas uma retórica mais sofisticada começa a faltar quando o escrivão do grupo resolve registrar suas andanças quando até a lua já resolveu partir! Enfim! Os trio de aventureiros pode estar construindo fama no vilarejo. Mas... Quando poderemos dar algo em troca à população local? Quando!?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

a feira vista por três pares de olhos

Começando pelo nosso combinado na reunião da quinta passada, só a título de explicação sobre nosso funcionamento de postagens, resolvemos nós três fazer nossos próprios registros sobre as visitas à feira, mandarmos uns para os outros (via e-mail) e depois, de forma consecutiva, um de nós escrever um outro texto para postar no blog. A bola da vez é minha, essa semana!

Confesso que reli algumas vezes nossos três diários para tentar achar uma ponte nos nossos escritos e uma ansiedade em fazer algo diferente acabou tomando conta. Meio experimental vai ser esse meu registro, pois é o primeiro.
Pegando a idéia de João de “este diário é um escrito do contrário”, começo não pelo seu fim que é o seu início, mas pela frase “como já bem disse Kleber, o ofício de pesquisador também trás seus ganhos para a vida doméstica”. Assim logo percebemos ao comprarmos tangerinas e quando comprei, pela primeira vez, uma couve-flor. A diferença da visita de João da minha, a princípio, era que “fui sem nada pra comprar, só tomar meu café da manhã”, enquanto João tinha dez reais pra gastar e chegar em casa com tangerinas, mangas e cana.

Depois de eu ser resgatada do meu entretenimento com uma “mulher emperiquitada, a avó fumando (aquela senhora que fica tirando os feijões da casca na minha primeira visita a feira) e o neto dizendo que queria um celular de brinquedo”, fui acompanhando João pelo caminho e a feira dele acabou virando minha também “pois parávamos pra perguntar o preço da manga e a tangerina mais bonita”. Ou como disse o próprio: “desenvolvemos enquanto consumidores nossos próprios passos. Buscando o melhor preço e a melhor qualidade, ou pelo menos um equilíbrio entre as partes”.

Há um ponto de encontro que acabei fazendo entre nossas percepções que é sobre a própria higiene do local, mas acabamos tratando de coisas diferentes. Bruna fala que chegou ao fim da feira e que esta seria “um momento de muita sujeira”, pois eram “frutas e verduras no chão, casca de amendoim, saco plástico...”. Eu observei isso já logo no início da feira que é tudo jogado no chão mesmo. Deparamo-nos uma vez, eu e João, na ocasião do anis estrelando, quando procurávamos um lixeiro pra pôr o copo vazio e perguntamos a uma mulher da feira que nos disse: aqui não tem lixo não, é tudo no chão mesmo, jogue aí!

Ainda na ocasião do (sempre bem-vindo) anis estrelado, João já havia feito uma visita ao banheiro público que por ali perto tem. Diga-se de passagem, que “consiste em dois box’s do tipo banheiro químico itinerante”. Achei engraçado na hora que li quando ele escreve “mijei esquivando-me da merda e prendendo a respiração”. Sim, na hora é engraçado quando se lê, mas é realmente um descaso com aqueles que fazem a feira acontecer e pensar como é que ficam aquelas pessoas que desde a madrugada estão ali pra arrumar suas bancas e só saem pra lá de meio-dia.

Já a minha percepção foi mesmo uma agonia que tenho ao passar pelas bancas que vendem as carnes. “Desvio o caminho e fico costurando de um lado a outro quando surgem essas bancas pelo caminho”. Posso até desviar meu corpo, mas minha atenção sempre se prende às mãos do homem pegando no dinheiro pra passar o troco e em seguida pegando na carne com o facão todo ensangüentado. Certa vez escuto aqui em casa que comprar carne na feira nem pensar, só no supermercado! Mas quem garante a higiene daquele que corta a carne lá? Só porque não está no alcance dos nossos olhos que acabamos confiando mais... Curioso isso. Mas sobre mim, to deixando até de comer carne (cômico!), mas até que de vez enquando esqueço isso tudo e só penso na minha boca salivando.

Uma coisa interessante que Bruna notou foi uma “criança vendendo as frutas e verduras da barraca à sua frente” e como já estão ali com responsabilidades a cumprir. Acrescento todos os outros meninos que por ali ficam: os do carrego, os que guardam o carro, e até os que ficam a deus-dará. Todos “eles também são a feira”, como dissera João. E temos também que voltar nossos olhos pra esses corpos que ali transitam com algum objetivo ou não. O “ou não” porque até mesmo “o homem que toma cerveja sentado do lado de dentro do bar vendo a feira como quem vê a praia num dia de sol” está ali e foi notado. Inúmeras coisas acontecem na feira e das mais inusitadas. Dá história pra qualquer contador que se queira.

Penso que mesmo a feira ressignificando o espaço da rua nas manhãs de sexta, como disse João, porque “impede carros de transitar, entrar ou sair, se apossa de calçadas e impede o trânsito de gentes que não passem pela feira”, aquela rua ainda continua com algumas de suas atividades. O barbeiro está ali com as portas abertas logo cedo cortando cabelo, a lanchonete “escondida atrás dos projetos de metal que são as bancas” distribuindo seus lanches, o salão que numa ruazinha logo ali às 8h já chegam suas clientes, a sorveteria que abre às nove horas... é uma nova configuração daquela rua que parece “violentar o espaço privado”. Talvez fosse interessante ver a relação dessas pessoas que têm suas casas tomadas por bancas de diversos produtos e a própria feira. Fico curiosa.

Enfim, concluo aqui algumas das impressões dos três pares de olhos que rondaram a feira nessa sexta-feira do dia dezenove. Sentindo que ficaram algumas impressões de lado e outras que não caberiam em palavras. Mas uma coisa é fato: a feira começa dentro de casa, quando se vê o que falta no armário e na fruteira.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

O primeiro encontro...

Gostaria de des-recalcar o primeiro post deste web-log, redigido pelo nosso amigo Lázaro, e lembrar a sua maravilhosa visão de Encontro. Um encontro enquanto choque, atrito, toque. E hoje, uma terça-feira, desesseis do nove, nos encontramos pela primeira vez com uma realidade que não era a nossa. E, como todo primeiro encontro, estávamos apreensivos e ansiosos ao confrontar alteridades.

Antes de prosseguir, devo advertí-los que tentei ao máximo seguir o conselho de João e não encarar o novo assim como Rousseau encarava o seu Emílio. Não assumo o papel de antropólogo que, fascinado pelos sabores exóticos, os pareia com paladares conhecidos. Interpreto um papel semelhante, porém mais desregrado. O da criança que consegue se desvencilhar dos pais num parque de diversões, brincando - encantada! - com tudo e todos!

Assim que adentramos numa salinha aos fundos do Lion´s Club, acompanhados por Marcos Monteiro e sua prestíssima lalação, fomos recebidos por muitos sorrisos e palmas. Melhor expondo! O Marcos foi recebido calorosamente!!! Era notável a coesão daquele pequeno grupo. Era notável o quantum afetivo dos idosos, seja para com os mesmos seja para com o Marcos! E foi ainda mais notável o fato de um grupo tão solidamente configurado nos aceitar tão docemente.

Nossas caras novas foram, então, apresentadas. Como estudantes de Psicologia! Ao ter nossa identidade secreta revelada, temi gerar desconforto no grupo, visto que não temos, em planejamento, nada a ofertar aos idosos. Mas, ao contrário, eles se mostraram bem receptivos aos nossos corpos estranhos. O problema que surgiu é um pouco mais embaixo. A apresentação sugeriu, implicitamente (ou nem tanto assim...), um comprometimento nosso com o grupo. A sensação de liberdade que um convite nos ofereçe foi substituída pela angustiante convocação d´uma seleção militar.

Saímos do quartinho da bagunça e fomos dirigidos a um pátio amplo. O pequeno grupo de idosos foi crescendo com o balancear do pêndulo. 10, 15, 20, 30 idosos. A maioria por demais participativa e animada com as atividades propostas pelo Marcos. Inicialmente, ele coletou algumas imagens em vídeo de algumas senhoras, como a Helena (que contou sobre seu falecido marido e sua única filha...) ou a Dona Joaninha (que, falando em morte, quase que mata alguém...). Soubemos que tais gravações serão reunidas para a criação de um filme/documentário mas - devido a esquecimentos - não nos interessamos em saber o porquê da película.

A reunião, após as conversas e gravações, dá início. Marcos começa a fazer, de forma indireta e divertida, os idosos alongarem e aquecerem músculos e ossos para o que virá. Méritos do professor doutor à parte, são os idosos que se deixam levar pela atividade, com vigor invejável. Sem exageros...

Seguem-se brincadeiras e danças populares, folclóricas, gerando momentos muito divertidos entre os idosos, Marcos e os três intrusos Psi. Tudo muito livre e espontâneo. Todos parecem gostar - e muito! - de estar ali. Momento especial foi a dramatização quase catártica que os senescentes fizeram de seu dia. Ouvimos desde histórias que suscitam piedade, como a perda de um parente querido até narrações sobre o que tiveram no café da manhã (destaque para o senhor que comeu cuzcuz, ovos, café, pão, bananas e mamão... e que, segundo seu vizinho, "não morreu!!!"...)

Fomos à toca do leão para observar um grupo de idosos, visando inferir os processos ascéticos e bio-ascéticos formadores de identidade neste grupo de terceira idade. Mas nos perdemos dentro deste mundo outro. Trocamos - como diria Rubem Alves - a caixa de ferramentas pela caixa de brinquedos. E adoramos isto...

Qualidade de vida e Idade Moderna - Anita Liberalesso Neri (Org.)

Tá aí, Áurea... ;)

Atividade e bem-estar psicológico na Maturidade
Embora não se tenha chegado ainda a uma definição final sobre o envelhecimento bem-sucedido, há algum consenso de que ele possa ser definido como um nível relativamente alto de saúde física, bem-estar psicológico e competência em adaptação (Wong, 1989).
O bem-estar psicológico ou a qualidade de vida na velhice são também referenciados como "moral", "estado de espírito", e "satisfação".
Considerar-se-à como pessoa idosa aquela que, segundo o critério adotado pela ONU, tenha atingido a idade de 60 anos.
Reich, Zantra e Hill (1987) apresentam a uma definição operacional de atividade: "um comportamento em resposta a um evento – fazer alguma coisa acerca dele." O termo atividade será aqui utilizado com este significado, e também como sinônimo de ocupação do tempo.

Atividade e significado pessoal
Significado pessoal é um sistema cognitivo construído individualmente, isto é, que é fundamentado em valores, e é capaz de dotar a vida de satisfação pessoal (Wong 1989).
Reker e Peacock – o senso de propósito de vida é positivamente correlacionado com percepção de bem-estar psicológico e físico.
Na idade avançada, o homem vê-se ameaçado quanto às principais fontes de significado, tais como trabalho, status social e empreendimento.
O envelhecimento bem-sucedido não é apenas um privilégio ou m direito, mas também um objetivo, uma condição alcançável por aqueles que lidam efetivamente com as mudanças que acompanham o tornar-se velho. A atividade sistemática, isto é, aquela praticada regularmente, empresta significado e satisfação à existência quer pelo compromisso e responsabilidade social nela implícitos, quer pela oportunidade de manter o convívio social.

Atividade e estabelecimento de vínculos
A maioria das teorias de ajustamento ao envelhecimento, incluindo a teoria da atividade, postula que o bem-estar emocional é, em parte, resultado a interação social e da força do vínculo social.
Segundo Lee e Thinger-Tallman, relações baseadas em parentesco, independente de serem entra ou intergeracionais, não afetam o estado de espírito do idoso, provavelmente em virtude restrição na livre escolha mútua e na livre manutenção destes relacionamentos.
Compartilhar de atividades grupais com pessoas da própria geração favorece o bem-estar do idoso porque facilita a emergência de significados comuns e a maior aproximação interpessoal, permite a ocorrência de catarse. Não importa a quantidade de relacionamentos, mas sim a qualidade. Para o seu bem-estar emocional importa o relacionamento íntimo em que posa ter no outro um confidente, Atividade, suporte grupal e prevenção de estresse.
Suporte social é definido como a presença de outra, e / ou dos recursos psicológicos e materiais fornecidos por familiares e / ou amigos, antes e depois de um evento devida estressante. O suporte social é importante somente na medida em que corresponder ás necessidades experienciadas pelo idoso.
O desempenho de atividades e o suporte social podem contribuir para reforçar o sentimento de valor pessoal. Consequentemente, reforçam o auto-conceito e o sentimento de auto-eficácia, facilitando o manejo das situações estressantes com as quais o idoso se depara em decorrência do declínio de suas forças físicas e de suas perdas pessoais e financeiras.

Atividade física, motivação e bem-estar psicológico
Formas autodeterminadas de motivação levam á maior flexibilidade cognitiva, intensificam a aprendizagem conceitual, despertam maior interesse, produzem um estado emocional positivo, maior auto-estima, mais altos níveis de felicidade marital, maior satisfação na vida, mais altos níveis de criatividade e têm efeitos positivos sobre a saúde em situações estressantes.
Muitos estudos têm demonstrado que proporcionar aos idoso escolhas, responsabilidade pessoal ou controle intensificam sentimentos de autodeterminação e tem efeitos positivos sobre seu ajustamento e bem-estar (Vallerand, 1989). Perece haver consenso entre os pesquisadores de que a autodeterminação aumenta a motivação intrínseca e a motivação extrínseca auto-geradora.

Atividade, crescimento pessoal contínuo e bem-estar psicológico
A Psicologia do Desenvolvimento vê o desenvolvimento ontogenético como um processo que dura toda a vida, e elimina a supremacia de qualquer estágio ou tempo de vida sobre o outro: em todos os estágios do curso de vida operam tantos processos contínuos (cumulativos) como descontínuos (inovativos).
O que tem contribuído para dificultar ou impedir ao idoso ter uma vida mais ativa?
A revisão da literatura evidencia a influência de fatores tais como: tradição cultural, estereótipos culturais e vieses científicos: ausência de autonomia do idoso e/ou atitude paternalista dos que lhe são próximos; valorização da produtividade em detrimento do lazer; aceleração da história; senso de limitação do tempo futuro; perda de amigos e contemporâneos e degenerescência.
Segundo Stones e Kozma (1989), há uma crença antiga no pensamento ocidental no sentido de que a atividade e a felicidade são entrelaçadas. A felicidade resultaria da razão ou da discrepância entre o número de desejos satisfeitos e o número de desejos totais.
Quando as pessoas idosas são vistas como um grupo marginal como ocorre na maioria dos países industrializados, tendem a ser penalizados como qualquer grupo marginal, e perdas sociais são acrescidas às perdas naturais da velhice.
Impedimentos socioculturais à autonomia e à atividade em idosos
A questão da autonomia do idoso é um aspecto fundamental ao seu bem-estar. A autonomia inclui a capacidade para a autodeterminação, para resistir a pressão social, para pensar e agir de certo modo, e para avaliar o Eu por padrões pessoais.
Outro aspecto que tem dificultado a participação do idoso em atividades é a perspectiva de tempo futuro, que para o idoso em geral é mais curta. Muitos não se sentem motivados a iniciar tarefas, uma vez que sentem limitação à sua continuidade. Beauvoir (1970), transcrevendo Chateaubriand, escreve a esse respeito: "minha juventude estava diante de mim: eu podia caminhar em direção a essa coisa desconhecida que procurava. Agora já não posso dar mais um passo sem tocar no limite".

Perspectivas
A gama de atividades existentes é tão ampla que torna possível, salvo raras exceções, uma escolha adaptada aos interesses e condições de saúde de cada pessoa.
A literatura recente tem enfatizado que não podemos subestimar a velhice, atribuindo-lhe somente perdas, visto que o processo de desenvolvimento, em todos os momentos, da infância á velhice, é um processo de equilibração ente ganhos e perdas, e não só de ganhos ou só de perdas.

testando

Oi gente, modifiquei nas configurações do blog os endereços que devem receber avisos quando comentários forem feitos nas postagens. Havia também a possibilidade de mandar um aviso sempre que eu publicar. Aí, cada um terá que alterar na sua página de configurações.
Vamos conferir então se vocês receberão dois e-mails avisando dessa postagem e do comentário que farei em seguida.
Abraço.
PS: Aurea, vc postou um texto no blog Entre nós. Não seria para esse blog?

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

As três ecologias - Fichamento... Ou não!

GUATTARI, Félix; As três ecologias; trad. Maria Cristina F. Bittencourt; rev. Suely Rolnik; 4ª edição; Campinas; Papirus Editora; 1993.


Nossos lifestyles, sejam individuais ou coletivos, parecem nos levar a uma progressiva deterioração do cosmos, do outro e de nós mesmos. Dialética excessivamente contraditória, esta, na qual toda evolução e progresso conduz-nos a nossa própria destruição! Só uma articulação entre a ética e a política - nomeada "ecosofia" por Guattari - entre as três instâncias ecológicas (a saber, a "natureza", o social e o sujeito humano) pode fazer afronta a tal desafio. Para o autor, a única resposta à nossas crises ecológicas (vale salientar a existência de três ecologias..) só se dará numa revolução - em escala planetária - não só política, mas social e cultural, alterando os objetos e objetivos da produção de bens (materiais ou não...)!

Os Estados - tradicionais mediadores - vêem sua função tornar-se cada vez mais reduzida, colocando-se como simples instrumentos do mercado mundial e seus complexos industriais. Os antagonismos leste-oeste, antigos formadores de subjetividade, cedem lugar a uma problemática norte-sul, decorrente da instauração de zonas de miséria nas grandes potências capitalísticas. Uma verdadeira terceiro-mundialização dentro do próprio Primeiro Mundo! Frutos do - como diria Guattari - Capitalismo Mundial Integrado!

Tais dualismos tradicionalistas, no entanto, não correspondem mais às problemáticas do agora. Os conflitos "atuais" são multipolares, sem ideologias a proclamar, sem bandeiras a carregar, sem maniqueísmos a introjetar. O rock é um ótimo exemplo. Nas palavras do autor, a cultura rock "desempenha o papel de uma espécie de culto iniciático que confere uma pseudo-identidade cultural a massas consideráveis de jovens, permitindo-lhes constituir um mínimo de Territórios existenciais (Guatarri, 1993)."

Destarte, devemos trabalhar nos dispositivos de produção de subjetividade; fugir da criação de sentidos da mídia, buscando novos caminhos de re-singularização, seja individual seja coletiva. Numa nova maneira de operar, devemos nos afastar do típico profissional "psi", retirarmos nossos jalecos brancos, nosso jargão pseudo-científico - enfim - desfazermos de nossa própria maneira de ser. Não se trata - a obra deixa claro - de esquecermos para todo o sempre de nossos sistemas e teorias, mas de re-orientá-los para uma nova prática, um novo uso. Devemos - isso sim - desancorá-los de seus terrenos passados. Igualmente, cada instituição, seja médica assistencial, pedagógica deve se preocupar em fazer evoluir sua teoria em busca de uma nova práxis.


Não podemos - proclama Guattari - nos deixar guiar pelos aparelhos de Estado, regidos - essencialmente - pelo princípio da economia de lucro. O Capitalismo Mundial Integrado - pós-industrial - descentrou seu focus de poder dos bens de produção para a produção de signos e de sentidos. O CMI não é tão somente produtivo-econômico, mas produtivo-subjetivo. Enquanto que a lógica capitalística dos conjuntos discursivos se propõe a limitar, esquadrinhar seus objetos, a eco-lógica, lógica das intensidades, considera apenas o movimento dos processos evolutivos, apreendendo o mundo através das três ecologias.


Essa ecosofia é insistentemente comparada, pelo autor, à obra do artista que, devido a um acontecimento qualquer, bifurca sua jornada inicial, levando-a para além do inicialmente planejado. Nesta nova lógica, consideramos os sintomas, doenças, desvios normativos como indicadores de uma nova subjetividade em potência. Os Territórios existenciais com que nos confrontamos tornam-se, aqui, não uma realidade fechada em-si, mas como um sutil para-si, para além de si. Na ecosofia, saímos da repetição, da ordem, do ritornelo existencial e caímos na imaginarização inventiva, que nos impede de cristalizar o real.


Tal ecologia social anseia a transição dessa "era da mídia" para uma "era pós-mídia". Uma reapropriação da mídia pela multidão de sujeitos e grupos-sujeito capazes de gerir a máquina midiática em busca de uma ressingularização dos valores. Não se trata, claro, de um novo modelo de sociedade "pronto para consumo". Trata-se, acima disto, de cedermos lugar às desterritorializações do social e de nós mesmos, levando-nos não a uma resolução milagrosa de nossos desastres, mas a um laisse-faire ativo, um deixar-se transbordar, conversão e reconversão de nossos Agenciamentos.


A subjetividade, enfim, instaura-se tanto no meio ambiente, nos Agenciamentos do social e, ao mesmo tempo, nas mais desconhecidas paisagens do indivíduo. Essa tal ecosofia, prática e especulativa, ética e estética, deveria substituir os antigos militantismos instituídos, sejam religiosos, políticos, associativos ou o que seja. "Assim, toda uma catálise da retomada de confiança da humanidade em si mesma está para ser forjada passo a passo e, às vezes, a partir dos meios os mais minúsculos. Tal como esse ensaio que quereria, por pouco que fosse tolher a falta de graça e passividade ambiente (Guattari, 1993)."