sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Fichamento
“Sejamos realistas, tentemos o impossível!”
Desencaminhando a psicologia através da Análise Institucional
(Heliana de Barros Conde Rodrigues)

A análise institucional toma a psicologia como nada mais do que uma dentre as instituições que se propõe a analisar, a desnaturalizar, a reinventar – a desencaminhar. (pág. 516)

Do “efeito Stalingrado” (1945) à ruína das plantações do escritos (1956)
Por efeito Stalingrado designamos as consequências, no seio da intelectualidade, e dessa participação: o Partido comunista francês se torna o partido dos intelectuais e, em articulação com a disputa pela hegemonia econômica e política mundial, instaura-se em termos de postura teóricas, um “eixo horizontal”, uma lógica de guerra fria. (pág. 516)

Sobrevivendo ao inferno – a Psicoterapia Institucional
Após a Segunda Guerra Mundial, os asilos psiquiátricos foram muitas vezes comparados aos campos de concentração.
François Tosquelles, Paul Balvet, Lucien Bonnafé, as ações que se conjugam através desses personagens tornam Saint Alban um espaço de alguma liberdade em meio à opressão: as portas do asilo são abertas e os pacientes convivem com as comunidades camponesas locais, intercambiando alimentos e modos de vida; (pág. 518)
Essa experiência ganhará o nome “Psicoterapia Institucional”. Nesse momento, as práticas grupais aparecerão como um dos principais recursos para a terapêutica da instituição e dos institucionalizados. (pág. 518)

Esses psicossociólogos maravilhosos e suas máquinas grupais
Enquanto no EUA as práticas possuíam caráter predominantemente adaptativo, na França serão reinventadas com vistas a transformações de caráter libertário, sobretudo em decorrência das novas misturas de que são objeto. (pág. 518)

“Se eu soubesse, não teria vindo...” – as Pedagogias Institucionais
Celestin Freinet, cujas idéias são o principal ponto de apoio dos movimentos do pós-guerra, sempre considerou elitistas os projetos existentes e, desde os anos 1920, procura criar “uma escola para o povo” (pág. 521-522)
Freinet conduz seus alunos de Bar-sur-Loup a passeios pelos campos – “aulas-descoberta, aulas-exploração, aulas-investigação”. (pág. 522)
Fernand Oury e Raymond Fonvielle fundam o GTE (Grupo de técnicas educativas), que aspira a superar os limitas teóricos da Pedagogia Freinet. (pág. 522)
Fernand Oury trabalha com turmas destinadas a crianças com supostos “problemas psíquicos”.
O GET define o campo educativo como sistema de relações inconscientes a analisar. (pág. 522)
Nos trabalhos do GET, conceitua-se instituição de forma análoga à Psicoterapia Institucional, para qual o termo designa, a princípio, uma forma social particular, seja concreta (o estabelecimento), seja jurídico (a organização); em um segundo momento, formas de organização das práticas, como grupos oficiais, etc.(pág. 523)
O GTI (Grupo de Pedagogia Institucional), seu modo de funcionamento é a pesquisa-ação: reúne-se semanalmente para debater os fenômenos grupais observados pos psicossociólogos. (pág. 523)
Lapassade ao compreender que era necessário superar a sedução da psicologia dos pequenos grupos, desmascarando a dimensão institucional, quer dizer, toda a política reprimida pela ideologia das boas relações sociais. (pág. 524)

O salto do acrobata
Com Lapassade, o institucional deixa de ser um nível adicionável ao grupo (ou organizacional).
A ordem institucional, que atravessa grupos e organizações, deve ser trazida à luz por uma análise realizada em situação. Daí seu necessário caráter de intervenção, que embora não elimine o trabalho psicossociológico, propõe que este seja permeável a todas as (des)institucionalizações. (pág. 525)

Um indisciplinado contrabandista
Guattari introduz, em meados dos anos 1960, a expressão “análise institucional”, mo intuito de caracterizar essa segunda geração pela presença de uma dimensão analítica. (pág. 526)
Para Guattari, só existem grupos – eles não são entidades, mas modos sócio-históricos de funcionamento.
Elucida a diferença entre esses modos, que entende como vertentes entre as quais oscila qualquer grupo concreto. Na vertente de sujeição do grupo estariam fenômenos tendentes a “curvá-los sobre si mesmo. Já na vertente do grupo sujeito não há medidas de segurança, o que redunda em problemas, tensões e riscos de desagregação. (pág. 527)

Maio de 68: a Análise Institucional sai às ruas
Quanto ao paradigma alguns quiseram ver nos acontecimentos a “ressurreição do homem”, considerando morto pelo estruturalismo. Não é fácil, entretanto, sustentar vínculo claro entre maio e sujeito, à vista de slogans como “somos todos judeus alemães”. (pág. 529)

Do ‘maio feito Mão (1968/69) ao ‘triunfo da rosa’ (1981)
Cumpre destacar acontecimentos que ainda evocam uma análise institucional generalizada. Apesar de Grande recusa, maio de 68 nem tudo recusara, e anti-colonialismo até então pouco ruidosos passam a trazer às ruas novas palavras de desordem. (pág. 531)

U livro-coisa: O anti-Édipo e a Esquizoanálise
Enquanto a oficialização da vertente socioanalítica da AI remete à sisudez de uma tese de doutorado – A Análise Institucional, de René Lourau, esquizoanalítica conduz ao que se apelidou um ‘livro-coisa’: O anti-Édipo, publicado em 1972. Nele, “isso” – o inconsciente ou desejo - “funciona (...) respira (...) come (...) caga (...) fode” (Deleuze e Guattari). (pág. 532)
Deleuze e Guattari avaliam que em maio de 68 algo da ordem do desejo se fez visível à escala do conjunto da sociedade, sendo invisibilizado a seguir tanto pelo poder de Estado quanto pelos partidos e sindicatos. (pág. 533)
A partir de 1969/70 se multiplicam, na França e fora dela, encomendas de intervenção institucional. (pág. 534)
Surgida em meio as agitações intelectuais da década de1960, no começo dos anos de 1970 a AI socioanalítica se defronta, consequentemente, com uma situação paradoxal: tenta dignificar-se a olhares epistemológicos por um sofisticado trabalho teórico, inseparável da realização de intervenções a pedido; vê-se ameaçada, através do mesmo processo, de uma institucionalização. (pág. 534-535)
À época, todos os conceitos socioanalíticos vão-se deslocando dos campos de referências originárias. (pág. 535)
A partir de 1973-74, Lourau e Lapassade passam a priorizar estratégias díspares. Lourau insiste no nexo dentre análise institucional e questão política. Lapassade, por sua vez, tenta combater o falatório excessivo das intervenções socioanalíticas, aproximando-se da questão do corpo. (pág. 535)

As aventuras da liberdade
A segunda metade dos anos 1970 trará muitas decepções para os esquerdistas.
O lançamento da Rede Internacional de alternativas à Psiquiatria, Guattari a ela se conecta sem hesitação. Através de encontros, manifestações artísticas e eventos culturais, a rede se contrapõe ao que igualmente se trama em rede: a minimização do controle social via os diáfanos de uma psiquiatria sem fronteiras asilares visíveis. (pág. 536)
A partir de 1975, Guattari estará entre os primeiros a participar dos rádios livres franceses.

O sonho acabou?
Em Vicennes, as transformações econômicas (neo-liberalismo em expansão) e políticas (derrocada dos esquerdistas) atravessam teorizações e práticas.
Lapassade vê semelhança entre o momento então vivido e o das primeiras experiências da AI: não há encomendas (“externas”) de intervenção, mas é possível pôr em análise as condições do estabelecimento do qual se faz parte. (pág. 537)
Os acordos entre os socioanalistas parecem, pois definitivamente rompidos. (pág. 538)

“Mudemos a vida aqui e agora”
Em 1981, François Mitterrand, candidato socialista, é eleito presidente da república francesa. (pág. 538)

Os anos de inverno (1981-)
E maio, no entanto, já se houve falar em “austeridade” e, a partir de 1983, no “rigor” exigido pela gestão capitalista do socialismo à francesa... Está perdido o apoio da intelectualidade ao governo. (pág. 540)

Implicações e sobreimplicações
Lapassade privilegia escritos de estilo autobiográfico. Lourau tende a fazer da análise das implicações do pesquisador a base para a constituição de uma nova epistemologia. (pág. 541)
Lourau em um trabalho de 1990, renuncia a tentar fixar um sentido estrito para o termo implicação. Com este intuito propõe um novo conceito, de caráter radicalmente crítico desse mesmo presente o de sobreimplicação. (...) ‘exploração da subjetividade’ que sucede à exploração da objetividade do homem no trabalho alienado. (pág. 543)

Polifonias da Análise Institucional no Brasil
A AI no Brasil é polifônica, pois fala francês (Belo Horizonte), espanhol com sotaque portenho (Rio de Janeiro) e italiano (São Paulo) – sempre, é claro, com nosso timbre e ritmo próprios, ligados às vicissitudes econômicas, políticas e culturais do país. (pág. 544)

Les Chevaux du Diable – o setor de Psicologia Social
Em Belo Horizonte, a criação (1963) do curso de Psicologia da Universidade de Minas Gerais quase coincide com instauração da Ditadura Militar.
Esse grupo, a princípio informal, passa a desenvolver atividades tão originais e características – pesquisa em saúde pública, ações de reforma em hospitais psiquiátricos, atendimento a demandas de intervenção psicossociológica dentro e fora da Universidade – que, rapidamente é visto como um ‘setor’ e, não muito depois, como “O Setor” de Psicologia Social da UFMG. (pág. 544)
Durante cerca de um mês, Lapassade esteve em Belo Horizonte em missão oficial.
Em todas as intervenções que levou a feita, a marca de seu estilo polêmico, ou mesmo contraditório aparece fortemente. (pág. 545)
A presença da AI em Belo Horizonte não ficou limitada, evidentemente, à vinda de Lapassade. Além do manejo cotidiano de ferramentas institucionalistas pelo Setor – aulas, pesquisas, e intervenções a pedido -, talvez o momento em que o projeto se tenha mostrado mais atuante seja o da reforma curricular do curso de psicologia da UFMG (1974) (pág. 546)

Usted Preguntará por quê cantamos – Psicanálise e Análise Institucional
No começo dos anos 1970, uma “primeira geração” (Coimbra, 1995) de Psicanálise argentinos viaja repentinamente ao RJ, oferecendo cursos e supervisões às organizações alternativas que abrigam psicólogos sedentos de formação analítica. (pág. 547)
Contudo, recorrendo às idéias de José Bleger (1922-1972), eventualmente propõe uma compensação: os psicólogos devem deixar a prática clínica aos médicos, porque lhes cabe atuação politicamente mais nobre – a de agentes de mudança social mediante ações preventivas em grupos, comunidades e/ou instituições. (pág. 547)
No Brasil, é intensa a mobilização pela redemocratização a partir da segunda metade dos anos 1970.
Em 1978, o IBRAPSI (Instituto Brasileiro de Psicanálise Grupos e Instituições). Em 1979 o IBRAPSI dá início a seu curso de Formação de Psicanalistas e socioanalistas, definindo quatro propósitos fundamentais: cientificidade, interdisciplinaridade, ampliação da formação e da assistência a amplos setores da população e articulação com as forças vivas da sociedade brasileira. (pág. 551)
Por mais que o IBRAPSI não seja exatamente um mar de rosas, seu crescimento incomoda alguns ramos da psicanálise oficial, que, do final de 1979 a meados de 1980, desencadeiam uma virulenta ofensiva através da grande imprensa. (pág. 552)
O IBRAPSI vinha investindo, desde 1981, em outro aparato teórico-político: uma vez por semana, seus professores reuniam-se com Baremblitt em um exclusivo grupo de estudos, tendo por foco o Psicanalismo, de Robert Castel, e o anti-Édipo de Deleuze e Guattari.
Ao mesmo tempo, começa a desenhar-se um novo espaço de profissionalização: demandas pontuais de intervenção mobilizam um ainda incipiente. Departamento de Análise Institucional (DAI) e os “não-psi” vêem finalmente surgir o campo para o qual os preparara sua “formação de socioanalistas” (pág. 554)
Cerca de 60 pessoas deixam (1983) o IBRAPSI por razões político-institucionais, parte das quais fundará, no ano seguinte, o Núcleo – Psicanálise e Análise Institucional. 1987, quando um grupo de cotistas se retira para fundar o CESOP (Centro de Estudos Sociopsicanalíticas). Cumpre ressaltar que a difusão da AI não é interrompida pelas cisões; ao contrário, a partir dos anos 1980, o paradigma se expande pelos campos educativo, universitário, comunitário, da saúde e da saúde mental, dada a multiplicidade de inserções dos integrantes das agora três organizações formativas. (pág.555)
Presa in carico – o desafio da desinstitucionalização
Na cidade de São Paulo, a presença da AI está primordialmente associada ao movimento da Reforma Psiquiátrica, cujo percurso conduz ao predomínio da perspectiva basagliana de desinstitucionalização – crítica teórica e prática da lógica manicomial em todos os níveis (científico, cultural, político, jurídico, assistencial e cotidiano). (pág. 556)
Em 1987, o II Congresso Nacional de Trabalhadores em Saúde Mental, realizado em Bauru, assume o lema: “Por uma sociedade sem manicômios”, de clara inspiração italiana, e o MTSM volta às ruas para um trabalho político-cultural que fora bastante negligenciado nos anos imediatamente anteriores. Ainda em 1987 começa a funcionar em SP, o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) Luiz da Rocha Cerqueira, serviço que se pretende substitutivo tanto do hospital psiquiátrico convencional quanto dos manicômios sem muros das formas alternativas de assistência. (pág. 558)
À medida que o “depósito de loucos” se transforma em hospitais, este via sendo desconstruído (lancetti, 1989): implantam-se o NAPS (Núcleo de Atenção Psicossocial) - serviço comunitário de portas abertas 24 horas por dia, 7 dias da semana, propondo-se a acolher todo tipo de demanda -, o Centro de Convivência Tam-Tam – voltado a promover mudanças culturais na relação com a loucura através de projetos artesanais, teatro, murais, e uma emissora de rádio.
Esta consolidação da tendência italiana de desinstitucionalização não é alheia, decerto, o projeto de lei apresentado, ainda em 1989, pelo deputado Paulo Delgado, que regulamenta os direitos dos doentes mentais e indica a extinção progressiva dos manicômios, a serem substituídos por novos serviços de atenção. (pág. 559)
c, o centro dias da semana, propoondo-se ospital psiquiiopsicanal anti-

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