quarta-feira, 1 de outubro de 2008

estudo de caso 5

Sete e quinze ou vinte, mais ou menos, da manhã e meu dilema começa: estacionar o carro. É um tráfego um tanto conturbante, pelo menos pra mim, toda aquela região em volta da feira. Eu estava exatamente na avenida que desce para a Rio de Janeiro, pois tinha descido a rua lateral ao Macro e esperava encontrar alguma vaga por ali na frente da caixa d’água.

Fui dirigindo devagarinho e prestando atenção em algum daqueles meninos que guardam o carro para ver se me notavam. Que nada! Presencio é uma briga entre dois, não sei por qual motivo, só vi a faca na mão de um ameaçar cortar o pescoço do outro. De longe um rapaz viu tudo e foi na direção pra tentar apartar a confusão. Não sei se conhecia os meninos, mas me pareceu um dos consumidores da feira. Só o vi pegando na faca do moleque e mandando abaixar... Não vi como se deu o fim da história, pois não podia continuar atrapalhando o trânsito. Resolvo estacionar no GBarbosa mesmo.

Entrei pela lateral da caixa d’água para olhar o movimento da barraca de pastel que já estava intenso. Não parei. Continuei o caminho indo por trás das bancas por onde tem umas que vendem roupa e paro na praça que tem aquela lanchonete que distribui a comida pra feira e que as pessoas podem usar o banheiro também. Logo quando estou chegando escuto um monte de gente rindo e a mulher da banca dos temperos que fica ao lado de uma série de cinco bancas de carne gritando: “Ihhh, Seu Chico! Tá tão fraco assim é? Toma vitamina A que é bom pra levantar”. E todos riam muito e a que deduzi logo ser a mulher do dito Seu Chico falava: “Ahh minha filha, ontem de noite me deixou foi sozinha na cama. Num queria era nada. Virou e foi dormir. Por isso tô assim hoje!”. Eu comecei a rir e esperar a defesa do tal homem que não satisfez a mulher na noite passada, mas só escuto todos por ali fazendo graça.

Em um instante toda a brincadeira pára e todos voltam a gritar para vim seus fregueses. Sai por um tempo dali pra olhar onde ficavam os banheiros químicos itinerantes, mas já com a pretensão de voltar depois. Estavam fechados e o cheiro não era dos melhores. Não quis ficar ali e fui comer meu pastel com caldo de cana lá da banca do início.

Pedi e fiquei por ali mesmo comendo bem devagar. Percebi que tinham três lixeiros pequenos em volta de toda a barraca, mas algumas pessoas continuam jogando o guardanapo e o copo do caldo no chão mesmo. Algumas se atentavam a procurar o lixo e se deparavam com ele transbordando. Já dentro da banca, onde ficam cinco funcionários, contando com o que frita os pastéis, não tem lixeiro algum e é um amontoado de papel jogado no chão. Não sei se o vento que leva os de fora pra dentro ou eles mesmos que jogam. Acho que há uma contribuição de cada lado mesmo.

Como já havia terminado de comer e visto o que queria, voltei pro banquinho da praça que tinha sentado anteriormente. Em comparação com o pessoal das frutas e legumes, eles são mais tranqüilos. Não ficam gritando o tempo todo e parecem se preocupar mais em abanar as moscas com um pano todo sujo de sangue. É um trabalho tão incessante de espantar as moscas que acredito que têm horas que nem ligam mais, porque é só parar de sacudir o pano que elas voltam novamente.

Fixei minha atenção em cinco bancas de carne e uma mulher dos temperos. Sendo que umas das bancas da carne era uma mulher. No decorrer do chegar-sair de pessoas pra comprar carne, reparo que eles usam a mesma balança como que num ritual normal deles mesmos, parecendo um combinado. As pessoas chegavam à banca e ficavam olhando aquelas carnes penduradas em ganchos que pareciam roupas à mostra para serem compradas. Observo os passos de um senhor bem disposto e animado escolher a que melhor lhe agradava, dizer a quantidade que queria e começar a falar o prato que iria fazer em casa naquele dia. Deixa o homem lá terminando seu serviço e vai pra banca da mulher comprar um rim (não tenho certeza, mas fiz consulta aqui em casa descrevendo o que era e foi o que me disseram!). Enquanto a mulher tratava o rim (?), já tava na banca do lado comprando umas tripas com o barrigudinho que só ficava sentado batucando o sertanejo que vinha do som da lanchonete da praça. Alguns minutos depois o freguês faz o caminho todo voltando, pegando e pagando o que consumia e dando adeus em conjunto pra todos.

O movimento na banca das carnes não é muito agitado. Mas reparei que quando alguém pára pra comprar fica bem uns cinco minutos e paga com uma nota de dez reais que às vezes nem volta troco. Em um intervalo tranqüilo desses fico reparando a mulher da carne. Ela é bonita, mas tem uma expressão muito séria e parece não se importar muito com o cheiro ou o insosso da carne. Ela muito calmamente pega no pano sujo e limpa a banca levantando as carnes, depois o espreme em um galão azul enorme de água, abana as moscas, guarda o pano por debaixo de um pedaço de carne, pega nos cabelos pretos para ajeitá-los, se volta pra trás para pegar um tamborete de madeira que segurava um pedaço enorme de carne, o coloca na banca e puxa pra sentar, senta-se em um líquido vermelho que escorre do tamborete e nem se importa em sujar a calça, depois sente o celular tocando e o pega para atender a ligação.

A essa altura eu já havia sido notada por ali, mas ninguém parecia se importar se eu os estava observando ou não. Na verdade, não sei nem se notavam. E por ali fiquei uns vinte e cinco minutos como se estivesse esperando por alguém que ia chegar. A única pessoa que toda vez que passava com um pratão de macaxeira e ficava me olhando era o rapaz da lanchonete. Em uma das viagens dele o cumprimentei com uma abaixada de cabeça e fui respondida da mesma forma.

Fiquei esse tempo vendo a relação dos feirantes com os consumidores e dos próprios feirantes entre si. Aqueles que eu observava não falavam muito, só o necessário. Entre si, muito pouco. A única conversa rápida que vi foi a mulher dos temperos indo entregar um saquinho para um dos da carne. Ela toda dissimulada vai como se estivesse saltitando, mas se mostrando durona, enquanto ele tira uma piadinha dizendo que o tempero está com cheiro de gambá e dá uma olhadinha marota nela. Ficam nessa briguinha boba e cada um vai para o seu posto.

Chegada minha hora resolvo ir embora, pois já eram quase nove. Saí achando que nem foi tão agoniante assim ficar vendo aquele amontoado de carne cheio de mosca por ali como relato nos meus diários anteriores. Acho que to me acostumando com a idéia.

Fui caminhando até o GBarbosa para pegar meu carro e noto que o trânsito continua bem intenso e mais gente chegando para fazer suas compras...

7 comentários:

Mairla disse...

visita do dia 26/09/2008



*gente, era bom confirmar... mas se não me engano ou não sonhei, eu escutei que a feira ia ser na quinta por causa da eleições. estou achando muito estranho, mas não consigo tirar isso da cabeça.
até :*

Juaum disse...

é...
minha mãe falou isso hoje... que seria na quinta tb... a de lá do sol nascente vai acontecer quinta mesmo.

Kleber disse...

então quinta.
abraço!

Bruna_ disse...

me senti como se tivesse na feira junto com você!

Lázaro disse...

idem bruna,
quase pude sentir o roçar dos papeis sobre os pes, rir do insucesso sexual do casal e a vivacidade da feira que enquanto pulsa permite até mesmo paqueras.

Primoroso, Mairla.

J. Thiago disse...

Carnes e moscas... Café embebido em anis... Gostosas gargalhadas em meio a facas e ameaças... Que mistura de sabores! O sal desta terra tem seu valor...

Kleber disse...

De novo aqui, para fazer uma observação cidade e campo. Feira e estacionamento no GB. Aí reside uma questão. Queria conversar sobre isso. Abraço!